sábado, 7 de novembro de 2015

Acordo à esquerda

Escrevo a uma mão. Como se de um recital de um meio pianista se tratasse. A outra mão, a menos importante das mãos, segura dez réis de gente, que dorme profundamente. A mão menos importante, segura naquilo que me faz viver e envaidece-se por isso. Reclama importância por dependermos dela. Reivindica cuidados futuros, ameaçando perder a força de repente, caindo-me a vida e este aconchego de cinco quilos, que tranquilamente me dá a paz de uma criança.
Enquanto se mantiver este impasse da mão esquerda, seguro-a com a mão direita, não vá ela boicotar a força e deixar cair o que mais importante há na vida. C o m a s d u a s m ã o s o c u p a d a s , a p e n a s s e c o n s e g u e e s c r e v e r a e s p a ç o s c u r t o s ,  e s p a ç a d o s d e i m a g i n a ç ã o.

Acordaremos que em diante as tarefas de segurar a faca, limpar o rabo e acenar quando for para dizer adeus, ficará sempre a cargo da mão esquerda. Será ela também a espaçar as palavras e a embalar os filhos.
Como não sei por quanto tempo durará este acordo, aproveito o tempo para olhar, sentir respirar, ouvir chuchar e aconchegar estes dez réis de gente, embalados por esta mão esquerda ávida de poder.

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