sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Fatias de noite

Entram fatias inteiras de noite
pelos buracos, dos buracos dos estores
fossem aqueles buracos, escavados dos amores
fundeados à picareta, ao murro e ao açoite

imperialistas, as pás que desaguam em vento,
trauteiam ritmos sincopados sobre o corpo
nu, ferido, curvo e revolto ao desalento
rompem-se dos dedos, os anéis ao metacarpo

pedaços inteiros de claras de noite
a manhã mais cinzenta ao ópio absorto
de parir o dia, num leito que se aceite

na ferida do corpo, larvas que sugam o que resta
do resto da festa, na parte de lá da gangrena
a parte que dá pena, do círculo à aresta

parar a sesta ao inerte que não presta
em deixar morrer a noite
e todo este amor que se escapa pela pequena fresta

da janela, e dos buracos,
dos buracos dos estores


E.M. Valmonte